onde vários santanenses ilustres figuram na história de importantes áreas 
do Pensamento Comunicacional Alagoano 

Jornal do Sertão, em Santana, primeiro jornal diário da cidade.
Centro histórico de Santana do Ipanema



Santana do Ipanema - terra de escritores - construindo a história do pensamento comunicacional em Alagoas onde vários santanenses ilustres figuram na história de importantes áreas do Pensamento Comunicacional Alagoano homenageados no Calendário cultural Santanense
HOMENAGEADO NO CALENDÁRIO CULTURAL SANTANENSE 2022
dramaturgo Marcello Ricardo Almeida


Folclore revisitado por escritor santanense



O folclore brasileiro é visitado em cinco histórias que narram: o cotidiano dos moradores de uma vila de pescadores em meio à realização da farra do boi durante a Semana Santa; os conflitos surgidos em uma comunidade perdida entre montanhas pelo temor de que se cumpra uma antiga lenda envolvendo bruxas e lobisomens; as aventuras do boto que se transforma em homem e seduz jovens moças às margens do rio Tocantins, no Pará, e a surpreendente reviravolta que ocorre em seu destino ao ser adquirido por um colecionador de Santa Catarina; o esforço de um menino para realizar seu grande sonho: participar da dança do pau de fita durante os festejos juninos da sua escola; em uma fábula, as peripécias dos personagens do folguedo boi de mamão em visita a seus parentes do Norte e Nordeste do Brasil, o boi-bumbá e o bumba meu boi. (EDITORA UFSC). ONDE COMPRAR ESTE LIVRO? à distância de um click.








Água de Cisterna
Poema de Morche Ricardo Almeida


Bebi água de cisterna

portinhola de madeira
teto com duas águas.
Bebi água de cisterna
bica em zinco ou
folha-de-flandres.
gota a gota,
pingo a pingo.
Bebi água de cisterna.
Aparando água de chuva.
Quando chove...
Água que corre em calha,
já rasa; lodosa,
em busca de descanso;
no fundo.
Bebi água de cisterna.
Buraco cavado na terra,
revestido de cimento.
Bebi água de cisterna.
Onde encontra repouso,
sairá em vaso de metal,
madeira ou plástico.
Para saciar
o sedento de tudo.
Fundo escuro, úmido.
Morada de anfíbio sem cauda,
desdentado e de pele verrucosa.
Cisterna.

OS LIVROS E A BIBLIOTECA

Manifesto do poeta alagoano Marcello Ricardo Almeida





Há quem impeça, em pleno século XXI, uma biblioteca em cada bairro santanense? Iniciarei esta conversa com esta indagação: Há quem impeça, em pleno século XXI, múltiplas bibliotecas em cada município alagoano? Como uma espécie de manifesto do poeta Marcello Ricardo Almeida.









 Uma biblioteca chamada semente

O sertão alagoano, de onde eu venho, continua sedento por livros, sedento também o litoral, aonde eu fui. Entregue as chaves dessa casa do saber às mãos de um grêmio literário, de uma agremiação estudantil, de um padre, de um grupo de teatro, um pastor, uma boa alma. 

Estimular intelectuais alagoanos a manterem ininterruptos contatos com estas sementes (bibliotecas espalhadas em Alagoas. Vamos desenterrar os talentos. Fazeremos os líderes políticos e religiosos acreditarem que o Paraíso é um lugar cheio de bibliotecas[1]). Oxigenando-as com ilustres visitas de alagoanos dramaturgos, contistas, ensaístas, roteiristas, cronistas, juristas, romancistas, artistas plásticos e poetas e outros que honrariam quaisquer partes do mundo.

E Alagoas passe a ter a lembrança desses intelectuais que honrariam quaisquer lugares do mundo; e que eles sejam modelos em lugar da violência e do analfabetismo.

Uma biblioteca não pesa no bolso 

Nas linhas do poeta de Palmares: “As minhas Alagoas são outras”. As minhas Alagoas, as Alagoas do poeta Marcello Ricardo Almeida também são outras.

Os escritores alagoanos são muitos, muitos intelectuais que honrariam quaisquer lugares do mundo; e esta luz continua embaixo da mesa. Tenho insistido que essa luz seja levada para cima da mesa. A imagem de Alagoas não pode continuar sendo as faces da violência (a tragédia) e do analfabetismo (a comédia). 

Caixas de livros com asas

Todos nós temos uma grande dívida com Alagoas. Para solvê-la, muitas caixas de livros ainda terão que ir de mãos em mãos. Uma academia de letras é uma instituição de grande responsabilidade social; a imortalidade de seus acadêmicos não representa um tácito contrato com Deus para imortalizar os intelectuais em suas cadeiras perpétuas. 

O pai de Capitu, Machado, co-fundador da primeira de nossas academias de letras, quis moralizar o escritor; as academias de letras depois de Machado de Assis se justificam se concorrer para moralizar a sociedade.

E o que atrai?

A imagem de Alagoas não pode continuar sendo as faces da violência (a tragédia) e do analfabetismo (a comédia). O que atrai? Cabeças de bandoleiros nas portas de igrejas em latas de querosene? O que atrai? A vampirização dos noticiários? O que atrai? Ninguém em Alagoas publica mais um livro? Ninguém mais estreia um filme, uma peça de teatro? O que atrai? Ninguém mais inaugura uma exposição? 

O que atrai? Por que nunca mais se festejou a construção de outras universidades federais? O que atrai? Não se inaugura mais um museu? Aonde anda a multiplicação do número de boas escolas públicas? Continuará utópica a democratização do saber? A imagem de Alagoas não pode continuar sendo as velhas faces da violência (a tragédia) e do analfabetismo (a comédia). Estamos no século XXI. O século da erradicação da miséria humana. 

Os nômades no deserto africano não acreditavam no fim da escravidão, mas a escravidão chegou ao fim até mesmo àquelas caravanas de camelos e homens antigos que ainda hoje caminham no Tenerê como fizeram seus antepassados há centenas de anos.

O livro consegue atravessar pontes?

O livro publicado em Recife, Maceió, Aracaju consegue atravessar a ponte? Quem conhece quem, se atravessar à ponte? Não se sabe. O livro publicado em Santana do Ipanema ou em Pão de Açúcar, dificilmente será conhecido em Maceió. Se o livro nasce em Delmiro Gouveia ou em Feliz Deserto, como consegue atravessar a ponte se continua “inédito”? Como chegar o livro às mãos do povo sem bibliotecas? 

Quem conhece quem, se atravessar à ponte? Não se sabe. Ao menos consegue atravessar a rua? Não, ainda assim; o vizinho da frente desconhece a escritura do vizinho de porta. 

E a literatura de quem escreve consegue atravessar calçada? Há quem não tenha certeza. Às vezes, a boca está cheia de um Ginsberg ou de outros intelectuais estrangeiros, ídolos de pano que nunca ouviram falar em Maceió ou em Santana do Ipanema, por exemplo, nem na Serra do Almeida, ou da Maravilha e do Poço onde muito se falou na existência de um cemitério de elefantes. 

E os escritores que moram dentro dos livros? 

Mas os adoradores de Caramuru salivam ao pronunciar Shakespeare, pronunciar Joyce, pronunciar Kafka, pronunciar Brecht, pronunciar Elliot, cumming, Rimbaud, Whitman; e dizem muitas partes de seus livros numa decoreba típica de quem sofre do Complexo de Caramuru. Eles elogiam Fausto, de Goethe, mas se enojam dos poetas de cordel. Será que escritores de lá têm os nomes dos escritores de cá na ponta da língua?

Quem imortaliza os acadêmicos de uma academia de letras? Seus livros indo de mãos em mãos. O sertão alagoano continua sedento por livros, sedento o litoral. Todas essas academias de letras têm o compromisso em levar os livros de mãos em mãos. 

O que impede, em pleno século XXI, bibliotecas em cada município alagoano? Convido vocês a sonharem este sonho e, aos poucos, as duas faces (tragédia e comédia) violência/analfabetismo não mais irão amedrontar as ruas de Maceió ou de Santana do Ipanema, por exemplo. E cada município fará o seu caminho caminhando.

E a infância de "era uma vez"?

É correto afirmar que muitos livros são espécies de clarões para quem ler ou escuta falar a respeito deles. Quem planta um livro, quem acende esta luz, o primeiro a ser beneficiado é o agricultor, o primeiro a ser iluminado é quem acende a luz. 

Algumas crianças descobrem a existência dos livros em A Cachoeira de Paulo Afonso, outras em Grande Sertão: Veredas, ou ainda em Vidas Secas, ou quem sabe em João Urso, ou em Infância. Infância de cada um é cheia de surpresas e cabe, desde ontem, fazer com que essas surpresas (habitantes das bibliotecas) sejam as melhores possíveis.



[1] Dialogando com o argentino Borges.

O QUE O POETA ALAGOANO DIZ SOBRE A POESIA


O QUE É POESIA, POETA MARCELLO RICARDO ALMEIDA?
Teoria Literária e Crítica ao Estudo da Literatura e da Arte como proposição analítica e auto-analítica aos novos leitores, escritores, poetas e dramaturgos
Poeta Marcello Ricardo Almeida







A PALAVRA DO POEMA NÃO ESTÁ ESCONDIDA NA POESIA
A PALAVRA DO POEMA ESTARÁ ESCONDIDA NAS LETRAS






“SOFTWARE” PARA POESIA

Muitos teóricos de literatura defendem a idéia de que a poesia não pode existir sem a linguagem. Com o Pós-Modernismo, entrementes, a poesia de vanguarda se apresenta das formas mais inimagináveis possíveis. É talvez a poesia experimental, ou uma de suas modalidades, a poesia sonora, por exemplo. A sonoridade também não deixa de ser uma forma de expressão, ou de linguagem.

Uma velha música de “Blues” (que quer dizer azul; depressão nervosa; e até algo muito erótico) intitulada “I Put on You”, além da poesia tradicional, Jay Hawkins, ao gravá-la, explorou certos sons de sua voz, como se estivesse roncando, ou alguma coisa assim, fazendo, certamente, poesia sonora. A música de origem africana é secularmente o melhor exemplo de poesia sonora. No ano de 1996, acadêmicos da PUC-SP, do Laboratório de Línguas Sonoras, lançaram o CD “Poesia sonora: do fonetismo às poéticas contemporâneas da voz”.

Mas nem sempre foi assim. A poesia foi dita como algo divino. Segundo a sua interpretação, a poesia surgia no instante em que o poeta, possesso e inspirado, escrevia os seus poemas. Dezenas de séculos se passaram de lá para hoje. Em breve – não adianta mais o descrédito – vender-se-á, em lojas de departamento, fantástico “softwarte” para romance, teatro e também programa para computador com a poesia. No passado, vendiam-se dicionários para se ensinar aos menos inspirados como fazerem poesias rimadas. E por que não “software” para ensinar aos menos inspirados como fazerem poesias sem ou com rimas? Os poetas deste “software” serão poetas com méritos ou poetas sem méritos?

Com um programa para computador na área poética, simplesmente, acionando um comando, irão aparecer os vários motivos do poema: as figuras de retórica necessárias para registrarem os sentimentos; quais as palavras cujos sons se repetem em outras de múltipla escolha; a melhor rima (paranomásia ou interior); as coincidências sonoras em grupo de palavras; a plasticidade; a harmonia; a semântica; os signos exatos e com a precisão de uma máquina “inteligente”; os fonemas constritivas vibrantes ou laterais, abertas, nasais, orais, fricativas, fechadas, oclusivas e seu poder sugestivo; a onomatopéia; a comparação; a metáfora (implícita ou explícita); a alegoria, o como funciona e qual o efeito e onde empregar, e, por fim, caso não se deseje acrescentar mais, contratando bons analistas de sistema, juntamente com profissionais de literatura e poetas. Agora é só por tudo em um CD-Rom e comercializá-lo nas escolas.

Doravante, esta uma teoria do paradoxo enquanto teoria literária e crítica ao estudo da literatura e da arte como proposição analítica e auto-analítica aos novos leitores, escritores, poetas e dramaturgos tornar-se realidade, quando esta ficção dos poetas de “software” estiver nas gôndolas de supermercados, os poetas decerto serão mais humildes. Tornar-se-ão, pois, mais mortais; e as ideias de que o poeta é alguém possuído e inspirado por um deus, significará tão-somente mais um capricho da filosofia. Assim é a história. Os dias de ufanismos poéticos (reverência, ali vem o poeta) estão ao ocaso; e a jactância dos poetas morrerá com o advento do programa (“software”) na área da poesia. Artimanhas comerciais no mundo globalizado. Tudo isto é resultado do Pós-Modernismo ou do Pós-Pós-Moderno. Alguém, nesta globalização, ainda encontra tempo para a poesia?

A POESIA É POUCO LIDA E PRATICADA ATUALMENTE?

Não é verdade que a poesia é pouco lida e praticada atualmente. Nas escolas, em geral, os livros de poesia são bastante apreciados. Isto em grande diversidade, embora a gula de livreiro reclame – porque a glutonaria não sabe fazer senão idêntico desejo do excesso. Os livreiros reclamam de barriga cheia.



Ano a ano o mercado de livros cresce. A poesia é mesmo um gênero complexo e mutante, neste mundo dos livros. Como explicar as contradições da poesia? Existem dois caminhos motivacionais à leitura: primeiro, a poesia; o outro, as estórias em quadrinhos. É frequente uma pessoa desconhecer, ou não se lembrar, por exemplo, o nome do autor da letra de certa música (poesia cantada), inobstante, não sai de sua memória dois ou três versos. Isto ocorre em qualquer nível intelectual. Como explicar esta contradição? Se for realizada a seguinte enquete: “É mais fácil aprender a ler com um livro de poesias (infantis ou adultas) ou com um livro em prosa?” A resposta irá coincidir com o que apela aos sentimentos, ou seja, a estética. É o mistério da poesia, são os segredos da boa poesia. O que atrai as pessoas à poesia?

A QUÍMICA DA POESIA OU DO POEMA

Se a curiosidade é a química do filósofo, a imaginação é a forja do poeta. Curiosidade e imaginação são esteios de uma mesma ciência (saber).

Toda criança, embora haja exceções (graças à democracia ou ao espírito humano e suas características), possui em seu âmago filosofia inata. Na outra ponta da linha, a poesia, pois em todas as idades, sobretudo na adolescência, ao se permitir o exercício da imaginação muito mais se comparado a outras épocas, é onde, verdadeiramente, apresenta-se o gostar da paixão, do se apaixonar que nem os poetas.

Poeta não é só quem escreve poesias. Desde Homero com Ilíada e Odisséia até o poeta sentado em um banco escolar, ou em alguma cidade pequena, ou em outro ambiente a escrever poesias, com suas inseguranças e ausências de oportunidades políticas. Indubitavelmente, em cada canto existe gente fazendo poesia e poesia de qualidade. Por esta razão, dentre outras não menos importantes, o rádio (veículo das poesias cantadas) foi e é um dos instrumentos de comunicação popular e democrático. Em síntese, nossa língua é poética por natureza. Daí, todos gostarem de samba? Tudo dá samba ou pode ser poesia? Depois de Einstein tudo ficou relativo?

RELATIVISMO POÉTICO

Há pessoas achando em tudo estética, outras consideram poesia. O povo, de um modo geral, conhece a poesia como forma legítima de arte. Poesia, conforme se conhece tradicionalmente, a arte de se escrever em versos, obedecendo ao ritmo etc., vem sofrendo mutações há muitos anos. Em cada século, a história da poesia, do fazer poético, muda, no mínimo, três a quatro vezes e, nessas mudanças, umas resistem, amparadas por convencimentos teóricos, outras acabam em nada.

Conforme mencionado, em cada lugar existe alguém fazendo poesia de qualidade. Não existe uma cultura jornalística ou acadêmica para investigar e pesquisar a literatura produzida em cada município. Pessoas tímidas preferem engavetar suas poesias, com medo de críticas maldosas, com medo dos plagiadores criminosos. As pessoas nas escolas, por exemplo, desde o ensino fundamental, ensino médio e até universitário, querem se proteger da frustração comum na estrutura autoritária da escola a qual desrespeita violentamente com chacotas e maus-tratos, bullies etc.; desta feita, os fracos escondem seus talentos.

Será que existe mesmo um relativismo poético, dele nascendo os mais inusitados motivos de expressões verbais, ou não verbais, sonoras ou não sonoras, e a isso se dá o nome de poesia?

Não é advogar em nome do Relativismo Poético, ou seja, ignorar que a poesia é a forma legítima de arte. Há, entrementes, quem defenda um feito poético não apenas no texto (em prosa ou em verso), mas também em pintura, em escultura, em fotografia, em cinema, em audiovisuais ou mesmo em outras atividades consideradas não artísticas.

Onde se encontra emoção, onde se encontra o não aborrecimento, a não chatice estará poesia? Defensores do relativismo poético, da desindividuialização da poesia, asseguram que nessas criações (“shopping”, edifício, rua, cidade etc.) se encontram sentidos e ritmos e sons.

Poesia, como se conhece através dos tempos é, antes de qualquer coisa, a imaginação (reflexão) renovando os sentidos da vida, os prazeres da vida, a emoção, a estética. Qual é esse universo da poesia tão misterioso e quase intransponível de que se fala tanto?

O MUNDO PARTICULAR DA POESIA

Não há de se lamentar que a melhor poesia não volte mais. A toda hora se forjam poesias horas a fio. Nas bibliotecas, nos depósitos de livros das pobres escolas pobres, em algum canto da casa está ao menos um livro de poesia.

Encontra-se sempre alguém produzindo poesia, elaborando a história particular de cada poesia, de cada sentimento.



Quem faz poesia recria o mundo. Com suas reflexões doces-amargas, amorávies-burlescas, transforma uma madeira tosca (a vida com ausência de felicidade) em obra de arte (a vida feliz).
Observe, por exemplo, os vários estilos musicais, os mais rudes ou eruditos, impregnados da mais imaginativa e emocionante poesia. 


É à força da poesia, ou melhor, mistério da poesia. Sem necessariamente se embriagar, drogar-se para descobrir o melhor mote do caminho poético. A poesia dos Beatles, a poesia de Shakespeare, a poesia de Cora Coralina, a poesia da vizinha Maria, a poesia da música “pop”, a poesia da literatura clássica, a poesia de Augusto dos Anjos, a poesia de Raul Seixas e Paulo Coelho, a poesia de Clarice Lispector, a poesia de Dona Lola – esposa de Graciliano Ramos, - que nos encontramos em um Festival de Teatro em Arapiraca e ficamos amigos, conversamos sobre literatura, Graciliano Ramos e a cachorra Baleia, a poesia de Castro Alves, a poesia contemporânea.

CRÍTICO DE ARTE É SEMPRE UM BICHO-PAPÃO?

Julgar é sempre um grande risco. Onde se arrisca o julgador e não menos quem é julgado. Os críticos literários menosprezando ou ignorando o preceito de Gamaliel para o qual não se deve combater o verdadeiro talento (in: Atos dos Apóstolos), costumeiramente traçam receitas da boa literatura. Há uma boa receita, um bom manual, para se produzir poesia de boa qualidade? Tolice. Esses críticos literários não diferem de alguns canais de tevê por cabo; um canal, em particular, apresentando um cozinheiro ensinando a cortar tomates, isto, das cinco da manhã à meia-noite. Aceita-se o crítico de arte que acrescenta ao trabalho artístico seus conceitos, jamais seus dogmas.

É conveniente a produção literária ter medo do bicho-papão? O medo da entidade fantástica com a qual se assuntam as crianças. Pois o tempo, conforme a experiência do bíblico Dr. Gamaliel, tem provado injustiça na biografia de sem-número de autores cuja justiça chega tarde, após a morte, ou morte de suas mais íntimas necessidades.

Razão é não julgar, mas compreender a máxima de que sempre haverá sapatos para pés doentes. Se cada poesia é o próprio retrato do universo poético, quando olhado por outra pessoa de sentimentos ou conceitos estéticos assemelhados; se cada poesia é um particular estado de espírito; se cada poesia é um mundo independente dos outros, mesmo sendo uma poesia (ou poema) paródia, uma imitação burlesca, julgá-la não cabe nem a outro poeta, todavia a posteridade, ao tempo.

Questione-se o que é a vida comparada à história. Então, para que ter medo dos opositores naturais ou artificiais, medo de escrever poesias, medo de apresentar ideias no emprego e não chegar em casa frustrado a chutar gato-sapato?

Engravidar o papel vazio não só é tarefa da caneta para escrever literatura com narrações sobre mortes, paixões, ambições; noutras, competições, adultérios, assassínios; outras, ainda, anti-heróicas ou terríveis, amoráveis ou burlescas. Ler e escrever são gumes da mesma faca.

Daí, como em toda a história da literatura, os fatos registráveis foram sempre mistos de realidade e de ficção. Em Autopsicografia, através de um dos heterônomos de Pessoa, poetizando ser o poeta um fingidor, realiza literatura poético-filosófica, registrando ficção e realidade. A ficção pura nem os poetas conseguem pô-la no papel. Sabe-se, porém, que os poetas não são apenas os consagrados ou os emergentes; também são crianças nos bancos escolares do ensino básico, compondo em suas agendas e folhas avulsas de cadernos – essas, nenhum crítico deve pôr a mão, oprimindo-as com suas frustrações.

Escrever poesia, redigir comentários acerca do fazer poético, de certo modo se conflita à realidade, onde o ter supera o ser. Se o ser é inferior, pelas estatísticas econômicas, ao ter, então, qual o motivo desta conversa sobre Poética? Na linguagem econômica, sobressalta-se o que tem cunhado em sua característica algum valor monetário. A poesia tem algum valor monetário? Todos os artistas são destinados a uma vida em opulência e riqueza? Se a resposta for negativa, o conceito das pessoas em relação aos poetas, a ideia do povo em se tratando de quem escreve poesias é o conhecido lugar-comum: a poesia é um artigo supérfluo. Por que a ideologia dominante dissemina que o poeta é um ser destinado à pobreza? Porque o poeta faz pensar.

Só acredita na poesia quem descobre o sucesso da poesia transformada em música e tocada diuturnamente até furar o CD. E isto parece curar essa doença de que a poesia não tem cura. Qual é seu mundo, poeta? Um mundo próprio. É o mundo-da-rua? É o mundo das palavras, dos signos, um mundo real e não imaginário, apesar do fingidor, segundo Fernando Pessoa, em Autopsicografia. Se o poeta finge ou não finge, a poesia também é uma fingidora?

A POESIA É UM REMÉDIO QUE CURA

São inúmeros os bichos-papões à espreita? É lamentável que os estudantes do ensino básico, em particular, e alunos em geral, por extensão, seus professores de Literatura ou disciplinas afins, ignorem que a poética é tudo com fantasia, e a fantasia é um dos mais importantes ingredientes da humanidade para se evitar a loucura, evitar-se o tédio, as doenças mais inusitadas. Para que ir ao estádio de futebol ver um jogo, um “show”? E o cinema, a televisão, o rádio, a música? Todos, além de outros tantos exemplos não elencados são modalidades de fantasias.

Escolas, sobretudo no ensino básico, deverão implantar a disciplina História da Poesia e experimentar numa caixa as poesias das mais consagradas, ou clássicas, ou contemporâneas, ou neoconcretas ou poema-processo, poema-objeto, poesia visual, pós-poesia, com as poesias dos alunos do ensino básico. Misturadas, dificilmente, saber-se-á quem é quem, caso não estejam às poesias alguns sinais ou exceto aqueles poemas santificados pela mídia. Muitos teóricos na área poética asseguram que “a poesia da mais alta classe pode existir sem metro e mesmo sem os contraditórios objetivos de um poema” (S. T. Coleridge).

Carnaval em Santana do Ipanema



A antiguíssima origem de carnis-valles e as suas variáveis históricas motivam pesquisadores para entender melhor o que é o Carnaval. Vários são os carnavais festejados em muitas partes do mundo, porque o Carnaval é plural embora este substantivo masculino de origem italiana (carnavale) seja singular. Onde surgiu o Carnaval? O Brasil é um dos que mais contribuem para a sua revitalização, e Santana do Ipanema, na Era da Internet, antecipa a Quaresma à maneira de seus brincantes: máscaras e fantasias, uma herança da Renascença, alegorias e simbolismos os mais diversos.

Esta é a pedra fundamental para a criação do Museu do Carnaval Santanense.

1. Quais os cenários e personagens memorizados nos carnavais de sua infância em Santana do Ipanema?

2. De que maneira descreveria os blocos carnavalescos de sua vivência santanense?

3. Do baú de sua memória, como eram os dias de Carnaval no Sertão alagoano (sexta-feira, sábado, domingo, segunda, terça-feira gorda e uma parte da quarta-feira de cinzas)?

4. Lembra-se das marchinhas cantadas pelos santanenses e as suas autorias?

5. E as composições que não saem da lembrança dos carnavalescos?

6. As escolas de samba em Santana do Ipanema permitiam o resgate da memória comunitária? De qual maneira?

7. Tênis Clube Santanense e Sede dos Artistas pontificavam os universos dos foliões santanenses, ou estes clubes não bastavam?

8. O Carnaval de rua que significado possui no panorama dos festejos de Momo em Santana do Ipanema?

9. Quais fatos pitorescos de antigos carnavais santanenses?

10. Se lhe fosse entregue a cidade nesses dias de folia, o Carnaval em Santana do Ipanema seria o quê?

REMI BASTOS: Quanto ao cenário, lembro-me das ruas principais, notadamente a Avenida Dr. Arsênio Moreira e Centro da cidade embelezado com cartazes fixados com pierrôs, colombinas, confetes e bandeirolas multicores suspensas que se estendiam por toda avenida. O Tênis Clube Santanense completamente enfeitado estava sempre disposto a receber seus associados que preenchiam os espaços do salão durante o reinado de Momo. A orquestra tocava frevos rasgados num convite eterno àqueles três dias de folia. Mas, um cenário que permanece cada vez mais vivo em mim, era quando eu subia ao palanque para cantar a marchinha Santana dos Meus Amores. Sobre os personagens, são vários, mas vou me deter em apenas quatro: Sr. Agenor e Albertino Marques montados em emas; Seu Nozinho Falcão usando aquela máscara de todos os anos, era maravilhoso, e Zé Sapo com suas fantasias improvisadas e variadas.

Falar sobre os carnavais de Santana do Ipanema nos anos que regaram a minha juventude é como dissertar sobre mim mesmo. Os carnavais da nossa cidade foram como um perfume inebriante que se dissipou no tempo, mas deixou sua fragrância em nossos sentidos, e onde quer que estejamos, ao lembrá-los, sentiremos que existirá sempre um pierrô e uma colombina jogando confetes e serpentinas no salão da saudade.


Minha infância, o Carnaval em Santana do Ipanema limitava-se apenas a alguns blocos de ruas quase sempre puxados por uma sanfona tipo pé-de-bode com seus complementos de percussão que percorriam as principais ruas da cidade cantando os frevos da época, tais como, "Você pensa que cachaça é água", "As águas vão rolar", entre outras, além das marchinhas tão conhecidas por muitos santanenses, "Olhe o bacalhau para nós é um colosso..."; "E como foi e como é o Urso Preto veio na barca de Noé..." Estas duas últimas eram cantadas durante os três dias de Carnaval, nas ruas e nas casas de familiares e amigos pelos foliões dos Blocos do Bacalhau, de Seu Carola, e do Urso Preto, de Moreninho, Zé Malta, Tacinho e outros. Surgiu nos anos 50, o famoso Bloco do Elefante que ficou marcado pelos foliões santanenses como um grande bloco. Naquela época ainda não existiam o Tênis Clube e a Sede dos Artistas. A Rua Nova ou Benedito Melo era, provavelmente, a rua onde ocorria uma maior concentração de blocos de rua, tais como o "Nega da Costa", "Os Cangaceiros", sem deixar de citar os famosos caretas ou simplesmente, "caretas-macabufas" com seus reilhos que emitiam estalos. Quando alguém os chamava de caretas, eles apenas respondiam por trás daquela máscara tão humilde quanto a sua alegria de brincar, "louuuuuro". Não existia violência.

Quanto aos personagens, lembro-me de Seu Agenor e Albertino em suas emas improvisadas e Seu Nozinho Falcão com sua máscara de todos os anos, os quais, solitariamente, desfilavam pelas ruas da cidade atraindo a meninada. Os carnavais de rua em Santana não iam além das treze horas, também não existia a evasão de blocos para animar os carnavais de outras cidades; tudo era participativo em nossa cidade.

Maria do Socorro Ricardo, o Carnaval de rua em Santana do Ipanema, ao meu modo de ver, teve duas fases, antes e depois da administração do prefeito Henaldo Bulhões Barros.

Antes do prefeito Henaldo Bulhões, os carnavais de ruas em Santana do Ipanema tinham períodos limitados de participações, ou seja, não extravasavam o período das 13 horas. Os foliões se recolhiam às suas casas onde ali davam continuidade aos festejos de Momo ouvindo a eletrola tocar as marchinhas da época ou mesmo alguém com um violão. À noite, não me recordo dos carnavais da nossa cidade na década de 50; sei apenas, conforme enfoquei, anteriormente, que a Rua Nova era foco da passarela dos blocos de rua. No entanto, foi a partir da década de 1960, já com as construções do Tênis e da Sede dos Artistas que o Carnaval de clube em Santana do Ipanema passou a assumir uma nova dimensão. Inúmeros blocos ou pessoas fantasiadas enchiam os espaços do Tênis Clube e da Sede dos Artistas, especialmente o primeiro. A lança perfume extasiava os salões com a sua fragrância envolvendo os foliões nos arremessos dos confetes e serpentinas. No sábado acontecia o Zé Pereira que, normalmente, saía da Sede dos Artistas percorrendo as principais ruas da cidade. As escolas de samba Unidos do Monumento e Juventude no Ritmo despontavam fortalecendo os carnavais de rua.

Todavia, foi na administração do prefeito Henaldo Bulhões (1969) que o carnaval de Santana do Ipanema estendeu as suas asas, notadamente, o Carnaval de rua.

Quanto ao cenário, lembro-me das ruas principais, notadamente, a Avenida Dr. Arsênio Moreira e Centro da cidade embelezado com cartazes fixados com pierrôs, colombinas, confetes e bandeirolas multicores suspensas que se estendiam por toda a avenida. O Tênis Clube Santanense e a Sede dos Artistas completamente enfeitados recebiam seus associados que preenchiam os espaços dos salões durante o reinado de Momo. A orquestra tocava frevos rasgados num convite eterno àqueles três dias de folia.

Mas, um cenário que ainda permanece vivo em mim, Remi Bastos, era quando eu subia ao palco para cantar a marchinha Santana dos Meus Amores, os foliões iam ao delírio. Nessa época, os blocos passaram a desfilar sem horários prévios de parar, prolongando as suas participações no QG do frevo, ali, na Praça Enéias Araújo, no centro da cidade. As escolas de samba tiveram uma participação efetiva, contando inclusive com uma contribuição maior da prefeitura e do comércio local. Inúmeros blocos de ruas surgiram, tais como o Bloco Pau D'arco (25/02/1965), O Bloco dos Piratas, Bloco do Bacurau, Bloco dos Cangaceiros, Furdunço, Bloco da Sogra etc. As ruas da cidade assumiram um cenário carnavalesco mais envolvente e participativo.

Eu limitaria o período de 1965 a 1972 como a fase áurea dos meus carnavais em Santana do Ipanema.

Vivi aquela fase como um folião que chorava a cada quarta-feira de cinzas. Foi nesse período que criei, juntamente com um grande amigo, Benedito Soares (+) o Bloco Pau D’arco, e, foi a partir daí que iniciei as minhas composições carnavalescas, tais como “Oi abra a porta oi nós aqui de novo”; “O Hino da Pitu”; “O Bloco do Brasil Gás”; “Seu Nozinho”; “A Noiva” e a marchinha que tanto me embalou nos carnavais da minha cidade e que até hoje é cantada pelo santanense nos momentos comemorativos e festivos, “Santana dos Meus Amores”. No entanto, outras marchas eram cantadas pelos foliões nos dois maiores clubes: “Você pensa que Cachaça é água”; “Me dar um dinheiro, aí”; “Bandeira Branca”; “É de fazer chorar”; “Índio quer apito”; “Mamãe eu quero”; “É dos carecas que elas gostam mais” e as tão famosas dos carnavais do Brasil, “Vassourinha” e “Cidade Maravilhosa”.

As marchinhas de carnaval que mais fizeram sucessos eu já as citei acima, porém, Santana dos Meus Amores foi a mais executada. Agora, outras composições de minha autoria são interpretadas não só em Santana, mas em outras localidades, inclusive em Maceió, por santanenses.

As escolas de samba “Juventude no Ritmo” liderada por Francisco Farias (Tamanquinho, seu primo) e a “Unidos do Monumento” comandada por Joãozinho de Zé V-8. Foram duas peças importantes que ergueram os carnavais de Santana do Ipanema. A harmonia que essas duas escolas executavam nas suas apresentações, certamente, ficou imortalizada na lembrança de todos os santanenses. No entanto, as mudanças de seus componentes e a falta de apoio local, com certeza foram os principais responsáveis pelo desaparecimento delas. Tudo no momento depende exclusivamente de alguém que tenha a mesma garra do Tamanquinho e do Joãozinho ou que se somem a eles, juntamente com o aval dos nossos gestores, políticos afins e do nosso comércio para que possa trazer de volta aquilo que nunca deveria ter entrado em dormência carnavalesca.

As maiores concentrações de foliões se davam no Tênis Clube e na Sede dos Artistas, o que na época se justificava. Agora, sabendo-se que já não dispomos mais da Sede dos Artistas e considerando-se que a cidade cresceu, assustadoramente, e que já não é mais aquela menina dos nossos sonhos, acredito que se tudo for encarado com a dignidade de um santanense que gosta de se divertir, uma das saídas seria a ampliação dos espaços (dancing) do Tênis Clube Santanense ao invés de se pensar em construir outro clube, não teria sentido.

O carnaval de rua representa a alma do folião. É, aí, que muitos aproveitam o momento para extravasar tudo àquilo que embaraçou os outros meses do ano. A criatividade vai às ruas de forma jocosa e feliz. Os blocos, desde que recebam algum tipo de incentivo, mas, sem a condição de posteriormente animarem outros carnavais que não o nosso, são os responsáveis pelo bom carnaval de nossa cidade e devem ir às ruas.

Sei de vários fatos pitorescos que aconteceram nos carnavais que brinquei em Santana do Ipanema, mas, em razão do espaço vou me limitar a contar apenas um:

Por volta de 1969, no segundo dia de Carnaval, os componentes do bloco, que eu dirigia, Bloco Pau D’arco, devido à injeção etílica do dia anterior, não compareceram na íntegra em minha casa, local da saída do bloco. Apenas três sobreviventes compareceram ao marco zero, eu (Remi), Motorzinho (filho de Seu Conrado) e Gevaldo Vilela (Teresão). Como não apareceu mais ninguém decidimos os três se filiar ao Bloco do Urso que na época era comandado por Valter de Marinheiro. Chegamos ao local da saída do referido bloco, na Movelaria Brasília, vizinha ao Bar da Pitu e a Drogaria dos Pobres, gerenciada por Genival Tenório. Valter nos recebeu com aquela alegria de sempre, porém uma coisa estava retardando a saída do Bloco do Urso. É que o tocador de pé-de-bode estava caído num canto da sala pelo efeito da “cachaça”. Já havia tentado de tudo para despertar a espinha dorsal do bloco e nada do tocador acordar. Foi quando Valter me falou assim: Remi vai até a drogaria e pede ao Genival dez sonrisais. Recado dado, recado cumprido. Cheguei com os efervescentes e entreguei ao Valter de Marinheiro, este por sua vez os despejou em uma lata de óleo, colocou metade de água que a vasilha jogava espuma por todo lado. Peguei o sanfoneiro pelas costas enquanto Valter despejava todo líquido efervescente na boca do suplicante. Não deu outra, dois minutos depois o tocador soltou um arroto semelhante ao apito de trem Maria Fumaça e pôs-se em pé já tocando a marchinha do Bloco do Urso. E, assim, conseguimos por o bloco na rua. (Deixo de relatar o fato na íntegra para não ocupar mito espaço).

Se eu tivesse a cidade e a chave do Carnaval de Santana em minhas mãos, certamente que eu faria um Carnaval aos moldes dos anos 60 e 70. O frevo tomaria o seu posto de antes; retomaria as escolas de samba e os blocos de rua; as ruas como antigamente seriam enfeitadas com amostra próprias da festa de Rei Momo; poria um policiamento ostensivo, contrataria boas orquestras de frevos e impediria, através de um acompanhamento fiscalizador, que aqueles blocos que recebessem incentivos da prefeitura ficariam proibidos de se deslocarem para outros municípios vizinhos. Quem quisesse tocar o seu “axé” que o fizesse distante do nosso Carnaval.