NAS CIDADES AS MICRO-HISTÓRIAS SÃO MACROS:


"O Crucifixo", uma das esculturas do Pe. Francisco Correia. Padre Francisco Correia, nascido às margens do São Francisco, em 1757?, em Penedo, é um dos baluartes da história de Santana do Ipanema. Veio a Santana quando ainda era Ribeira do Ipanema, em 1787. Tobias Medeiros escreveu "Padre Francisco José Correia de Albuquerque na Academia" (Maceió: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2008) esta e outras publicações, além da bibliográfica do religioso católico Theotônio Ribeiro, de 1958. O Padre Francisco Correia, um dos homenageados no Calendário Cultural Santanense 2011-2025, esculpia em madeiras obras sacras. "O Crucifixo", hoje na matriz Senhora Santana, é uma de suas várias esculturas (imagem acima), além desta escultura há outras, segundo Medeiros, em Mumbaça e Penedo. A primeira igreja católica santanense, 1787, foi iniciativa do Pe. Francisco Correia. Em Santana do Ipanema, os nativos que chegam pela BR-316 e os que visitam a cidade vão encontrar o Grupo Escolar Padre Francisco Correia, no bairro Monumento, pelos bancos do qual passaram inúmeros santanenses ilustres.





TESTEMUNHEI SANTANA DO IPANEMA VIR A SER O QUE É




Maria do Socorro RicardoEscritora e pesquisadora
TEXTOS & MEMÓRIAS


Houve uma era na qual era o campo a origem de tudo. Hoje, onde senão nas cidades a vida começa? Como está escrito em (2009, p. 46) Diálogos com Santana iconográfica de Zabé Brincão aos nossos dias: História do tempo presente, porque houve uma época na qual as cidades foram absolvidas no rolo compressor dos interesses dos Estados, como se a cidade, a história da cidade, não fosse importante; pois é, justamente, a cidade quem alimenta o Estado; desde a origem, a cidade é o ponto primordial da vida do povo, onde se relaciona nas ruas, nas feiras, no comércio, na economia, na política, nos casos amorosos, nas religiões, nas festas. É a cidade a mãe da vida civilizada, apesar de contrastes e contradições, pois na cidade se desenvolve a cidadania, os valores éticos (a alteridade – este olhar o outro como uma continuidade de quem vê –, a amizade, a honestidade, a franqueza, as virtudes); a cidade é onde se agrupam pessoas cujas preocupações são de realizarem os sonhos, criarem novas utopias e fortalecer a vida urbana.

A segurança da cidade, dentro de sua rotina, faz a vida passar com propósitos de suas histórias delineadas por suas memórias. Em cada esquina um gênio sem oportunidade, sem um grupo cujas identificações o mantém vivo.

É a cidade quem transforma a região, movimenta-a ou a degenera. A cidade, dentro de metáforas orgânicas, constrói praça como pulmões para respirar, e abre rua como artérias. Na cidade, projetos políticos surgem, projetos políticos se desmoronam; na cidade, a economia nasce e morre ou é esquecida; na cidade, os fatos sociais compõem a sua antropologia. A geografia da cidade é sempre semelhante à geografia de seus moradores. Cada morador da cidade com seu biotipo próprio e isto coincide com a topografia da urbe. Os valores simbólicos da cidade estão em todas as partes presentes em sua arquitetura, na maneira de se vestir de seus habitantes, na culinária e nos festejos populares. Inúmeras são as histórias na cidade. Parecem tão atrasados os livros de História adotados no ensino básico – não seria exagero acusar também os livros universitários. A História difere tanto para quem é testemunha ocular da História. Testemunhei a minha cidade vir a ser o que é. Conheci as suas pessoas, as suas histórias. Poderei realizar as minhas incursões em muitas pequenas histórias que fazem a macro-história de minha terra. Como neste meu poema em que capturo o dia de feira estendido nas ruas de Santana do Ipanema com sua luminosidade própria, o povo que corta a rua de passos apressados, o pregão de vendilhões sobre o calçamento de paralelepípedos, os caminhos de pequenos feirantes:


UM DIA DE FEIRA LIVRE EM SANTANA

Fora dos limites de Santana aproxima-se a câmara
Como se quisesse capturar a memória da cidade
Sob o Sol anda o povo em dia de feira livre e só
São pessoas que fogem de seus lugares ermos
Para se encantarem nos dias de feira livre; firmes
Como os passos de gigantes desolados, mesmo
Vindos de espaços escondidos no universo frio
Os seus sonhos estão nos bolsos em moedas
Para saldarem suas dívidas com algumas rezas.

Eu queria narrar os seus segredos de sacolas
Porém olho o relógio da matriz que diz as horas
A feira murmura os seus preços em alvoroços
Essa minha amiga que me cumprimenta a reconheço
Essa criança com carroça de feira cobra seu preço
Para entregar as compras do mercado em sua casa
As ruas se convertem em morros e as ladeiras falam
Conversam os feirantes sobre várias novidades
As ruas ficam tortas cobertas de barracas e toldas.

Os olhos dessas pessoas livres deste meu poema
Perdem-se na feira livre de Santana do Ipanema


A cidade pequena ou a pequena cidade possui o condão de expor os seus precipícios. Os noticiários, os telenoticiários e os webnoticiários alardeiam o dia-a-dia da vida nas cidades grandes como figuras mitológicas imprevisíveis que, ora tende ao mal, ora ao bem, em um maniqueísmo de uma balança desequilibrada acordam o cotidiano. Aquela cidadezinha esquecida em algum lugar do continente é a cidade que diz sobre si mesma com os seus dizeres, é a cidade de cujas personagens se constroem os medos e os sabores da vida urbana. Santana do Ipanema, a cidade mais importante do Sertão alagoano, com características próprias, é um município com campus universitário, professores e pesquisadores com ideais para fazerem de Santana do Ipanema uma outra Santana do Ipanema.